Ao descer de seu ônibus na rodoviária de Belo Horizonte às 4 e pouco da manhã, darás de frente para um caubói que toma cerveja em seus trajes típicos em um bar no setor mesmo de desembarque. Suba a escada à direita que dá no estacionamento da rodoviária. Vire à esquerda e caminhe por mais ou menos 400 metros, atravessando uma área onde pessoas suspeitas -- mas provavelmente dormindo em pé -- lhe observam, e então uma pracinha ocupada por um clã de mendigos. Ao avistar um enorme obelisco no meio de um cruzamento de duas avenidas, vire à esquerda e caminhe por mais 400 metros. Você verá uma enorme, antiga e bela estação com uma praça em frente, com belas fontes aqüáticas. Corra dali e dirija-se a um pedaço de rua à direita dessa praça. Um velho palco de antigos carnavais estará colocado mais ou menos no meio da simpática ruazinha de parelepípedos: é onde você pegará seu próximo ônibus.
Para entrar na estação é necessário ter um cartão com créditos recarregáveis. Um viajante prudente deixa sempre um pouco de créditos em seu cartão a fim de evitar filas e outros problemas de indisponibilidade quando chega cansado de viagem, com pressa ou em horários incomuns. Esse tipo de pessoa perceberá que foi totalmente ludibriado ao perceber que que os créditos do seu cartão, abastecido quando de sua última vinda a Belo Horizonte, há três meses, pereceram de prazo de validade e foram absorvidos pelos cofre públicos. Terá, portanto, que comprar mais créditos. O guichê onde os cartões são abastecidos abre às 5h, mas não se espante caso ele não tenha sido aberto ainda quando o primeiro ônibus chegar, às 5h10.
Com alguma sorte, um jovem de moletom, autorizado por dois ou três fiscais do sistema de ônibus que conversam alegremente, será o operador da catraca. Ele deixa entrar sem pagar os bêbados, os malandros, os pivetes. Bastante empático e perceptivo do desespero dos outros, esse bom rapaz provavelmente também lhe deixará entrar sem pagar.
Uma vez dentro do ônibus, não se intimide com os gritalhões e valentões que, ofendidíssimos com o motorista por ele ter parado nas estações, depois dos ônibus anteriores terem ignorado esses excelsos passageiros que nelas aguardavam, vão aos berros tirar satisfação.
O ponto final do ônibus, 40 minutos depois, é o terminal Morro Alto. Lá você verá, se procurar bem entre vários ônibus e pessoas que despertam a sua mais honesta suspeita, um veículo escuro, apagado, numerado 5882 e que abrigará em seu interior um motorista e um cobrador que descansam o sono dos justos.
Aguarde na porta por mais uns vinte minutos até que, repentinamente desperto, o motorista ligue o ônibus, abra as portas e já comece, de leve, a arrancar. Entre correndo, mas espere mais um tempo, enquanto as pessoas que têm o cartão carregado passem e peguem os melhores lugares, até que o cobrador acorde e resolva te cobrar a passagem nesse velho meio de pagamento, outrora o mais líqüído, o dinheiro.
Este último ônibus deverá levar-lhe, enfim, a Lagoa Santa.