Há esse conceito, criado pelo genial Nassim Nicholas Taleb, que diz respeito a processos nos quais a curva de retorno em relação a uma variável aleatória é convexa, ou seja, o retorno tende a ser maior quanto mais aleatoriedade for adicionada ao processo.
Disso aí, o próprio Taleb tira uma conclusão que resolve a questão da pesquisa científica propositada contra a sorte, sobre quais levam a melhores resultados práticos e invenções. Escreve ele:
A história da sorte versus conhecimento é a seguinte: Ironicamente, temos imensamente mais evidência de resultados (descobertas úteis) ligados à sorte do que de resultados vindos da prática teleológica (de telos, “objetivo”), exceto na física — mesmo depois de descontarmos o sensacionalismo. Em alguns campos opacos e não-lineares, como a medicina ou a engenharia, as exceções teleológicas são a minoria, assim como são um pequeno número de remédios projetados. Isto nos deixa numa contradição de que chegamos até aqui graças ao puro acaso não-direcionado, mas ao mesmo tempo criamos programas de pesquisa que miram num progresso com direção definida, baseado em narrativas sobre o passado. E, o que é pior, estamos totalmente conscientes desta inconsistência.
Por outro lado, pura sorte não poderia produzir melhorias sempre. Processos de tentativa e erro (que são os que produzem as descobertas “por sorte”) têm um elemento erro, e erros, diz Taleb, causam explosões de avião, quedas de edifícios e perda de conhecimento.
A resposta, portanto, está na antifragilidade: as áreas onde a sorte vence a teleologia são as áreas onde estão em jogo sistemas complexos, onde os nexos causais são desconhecidos ou obscuros — e são as áreas onde a curva de retornos é convexa.
Vejamos a mais sombria de todas, a culinária, que depende inteiramente da heurística da tentativa e erro, já que ainda não nos foi possível projetar um prato direto de equações químicas ou descobrir, por engenharia reversa, gostos a partir de tabelas nutricionais. Pega-se o hummus, adiciona-se um ingrediente, digamos, uma pimenta, prova-se para ver se há uma melhora no gosto e guarda-se a receita, se o gosto for bom, ou descarta-se-á. Imprescindivelmente temos a opção, e não a obrigação, de guardar o resultado, o que nos deixa reter a parte superior da curva e nos impede de sermos lesados pelos retornos adversos.
A conclusão geral é que, para obter os melhores resultados na invenção de tecnologias, deve-se usar a experimentação sem exageros e cálculos quando se identificar uma área antifrágil, e usar a pesquisa rígida e cheia de provas matemáticas (ou o equivalente) quando a área for frágil.
A inovação capitalista
Um processo antifrágil importantíssimo deste mundo é a inovação capitalista (dói-me usar este termo já tão mal-gasto e mal-definido por aí). Não falo, como alguns, da invenção de novas tecnologias, mas, como outros, da invenção de novas formas de usar as coisas (qualquer coisa) para melhorar a vida de alguém, de alguma forma — e aqui incluem-se pequenas adaptações de tecnologias antigas que dão origem a novas tecnologias não muito diferentes das antigas, e incluem-se também o oferecimento de algum serviço, trabalho ou produto já existente, mas de uma nova forma, possivelmente melhor para seu provável consumidor. Este tipo de inovação é, segundo me parece, o poder mais subestimado dos mercados livres, é irreplicável em laboratórios de pesquisa tecnológica (só pode surgir mesmo na vida real, da cabeça de quem está envolvido com o problema real que a inovação soluciona), e é o que gerou idéias como o restaurante self-service, a terceirização dos serviços de construção civil ou o Google.
Esse tipo de inovação (ao contrário do sentido de inovação ligado a pesquisas caríssimas em universidades ou megaempresas, identificada pela famigerada sigla P&D) é antifrágil porque não custa muito ao indivíduo, não requer investimentos gigantescos ou qualquer coisa assim, porque é normalmente apenas uma adaptação do que ele próprio já faz.
Para a sociedade, não representa custo algum: o serviço novo é oferecido paralelamente ao serviço antigo, seus consumidores potenciais podem escolher o que mais lhes agrada, e rejeitar o outro. Se a nova solução não for satisfatória os mecanismos automáticos do mercado (o prejuízo simples) encarregam-se automaticamente de remover aquela novidade — e, automaticamente, o indivíduo que a criou pode se voltar ao seu processo antigo, ou a uma nova invenção.
Ao mesmo tempo em que cometer um erro numa tentativa de inovação é barato e não atrapalha ninguém, um acerto pode ter conseqüências que melhoram enormemente a vida de muita gente. O restaurante self-service, por exemplo, provavelmente teve sua implementação tentada por restaurantes de serviço à la carte várias vezes, em vários formatos diferentes, sem muito prejuízo para o restaurante, que podia continuar com seu serviço à la carte (no Brasil, senão o inventor dessa modalidade de restaurante ao menos um dos seus grandes expoentes, estas tentativas ocorreram durante a década de 80). Mas, quando enfim deu certo, promoveu melhoras enormes na qualidade de vida de milhares de pessoas — que podem pagar mais barato e comer apenas o que querem e quanto querem, dentro de uma gama maior de opções, o que permite que trabalhadores de todos os tipos comam melhor todos os dias, fiquem mais felizes e gastem menos.